Conta minha lenda que certo
homem, que morava em uma aldeia, em certo lugar muito longe e que tinha
muita dificuldade em encontrar água. O homem resolveu que iria criar ali um
lago. Não um simples lago. E sim um lago cristalino, de água pura como nunca se
viu. E todos os dias ele depositava em uma baixa
afastada da cidade um pouco de suas lágrimas. Não eram lágrimas simples. Eram
lágrimas de esperança. Esperança de que seu desejo seria concretizado. E assim ele fez por vários anos. Quando chegando a sua velhice, ele já podia
olhar de cima da baixa e ver aquele desejo tão sofrido torna-se real. E assim são nossos sonhos. São desejos que se
realmente persistirmos tornaremos ele real. Mesmo que não importe o tempo
de espera a recompensa será mais valiosa.
Tempo que não passa Tempo que machuca Tempo que não esqueço Tempo que não volta Tempo que quero esquecer Tempo frio (agora) Tempo de felicidade (passado) Tempo sem sentimento Tempo, tempo, tempo Livra-me de tantos pensamentos.
A palavra vem a boca... Mas quando falar o que quero? Será que realmente tenho que medir o que tenho vontande de dizer? Medo de ser interpretada de forma diferente Medo de transparecer frágil. Medo do que posso ouvir Daquilo que não quero ouvir De que façam do meu momento frágil seu instante de vitória Silenciar no momento é necessário.
Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica. Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia. Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma. O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto. Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável. Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era. Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço. Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave? Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.